Eu me olhava no espelho e não conseguia gostar de nada que
via. O espelho refletia todos os meus defeitos, aqueles que eu não queria ver,
aqueles que eu escondia embaixo de tecidos e mais tecidos. O rosto que eu
escondia por trás daquela franja e daqueles óculos. Parecia que o verdadeiro
eu, trancado numa masmorra dentro de mim mesma agora se debatia mais do que
nunca, implorando para ser libertado. O eu que há anos eu poupava das pessoas,
da família, do mundo, com medo de que ele fugisse de dentro de mim e arruinasse
tudo lá fora. Foi esse medo que o manteve prisioneiro dentro de mim própria.
Ele gritava por socorro , e eu sufocava os gritos com músicas que escorriam
cínicas pelos meus lábios. Ele chorava, e eu prendia as lágrimas por detrás de
um sorriso inquebrantável. Ele tinha os piores pesadelos, enquanto eu fingia
sonhar e realizar essas mentiras. 24 horas por dias não era eu mesma, mas um
fantoche das outras pessoas e da sociedade visceral em que eu habitava. Nos
minutos que ninguém via, essa parte mais sombria de mim mesma me questionava se
isso era o certo, e eu tapava os meus ouvidos e a minha boca para não ter que
respondê-lo que ele estava certo. Esse eu morava dentro de mim como uma sombra
que eu queria que sumisse, mas na verdade, eu fui essa sombra durante todo esse
tempo e só ia deixar de ser, quando aceitasse receber aqueles raios de sol tão
vívidos que temi outrora. Eles eram quentes e podiam cegar, mas jamais me deixavam
mentir sobre mim mesma, pois iluminavam toda a face presa na penumbra.
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